...E agora? Fico sem religião?

Abri o mail e deixei o olhar escorrer entre uma e outra palavra.

Frases incrivelmente simples e bem escritas, que fazem todas as ideias parecerem cristalinas!

Acho que estou imensamente feliz!

(Claro que vou publicar o teu texto! Está SOBERBO! Obrigada!)

- Talvez valha mesmo a pena que Kabba exista! - pensei. - Ou será Kabba apenas um lugar dentro de cada um de nós? Uma parte integrante de cada um, um lugar na/da alma, e por isso simplesmente o ponto de encontro daqueles que ainda se orgulham de ter uma alma para cuidar!

(Pausa para raciocinar!)

- Será?...

(Continuei a falar comigo mesma, no silencio!)

A certa altura do texto que estava a ler (e que vou publicar aqui abaixo), a fabulosa escritora falou da "Aida".

- Lembram-se dela?...

(Pois! No final do texto... contarei qualquer coisa sobre este assunto!)

Assim: Estão perante um texto escrito a meias! - Eu, e um anónimo-especial...

Religião!
"O ser humano precisa de uma religião!?
Pessoalmente acho que sim!

A ideia de que tudo acaba aqui é no mínimo triste! Pelo menos eu acho!
Mas essa é apenas uma vertente da questão religiosa.
O que está para alem daqui? Ninguém responde ao certo…
Pessoalmente estou convencida de que a nossa condição humana é demasiado limitada para conseguir compreender!
Todas as religiões parecem ser unânimes num ponto:
Fazer a paz,
viver despegada de bens materiais,
partilhar…
(Atenção que esta é uma parte, no mínimo, muito difícil de cumprir!) Mas adiante.


Que religião escolher!?
Fui criada como católica, quando era criança a minha mãe obrigava-me a ir à missa, sem nunca me ter explicado porque raio existia a missa! Da mesma maneira na catequese nunca me explicaram (incrível), só me diziam que tinha de ir. E lá ficava eu, uma hora à seca, à espera que aquilo acabasse e a pensar nos desenhos animados que estava a perder! (isto traumatiza!)

Há uns dois ou três anos conheci um rapaz ligado a um movimento jovem qualquer, que me deu a seguinte explicação:
" - A missa existe, porque os rituais são necessários, em qualquer religião, para que a fé seja alimentada. A missa foi criada por Jesus na última ceia, em que usou o pão e o vinho como símbolos de si mesmo. Na missa são lidas leituras da bíblia e depois o padre fala sobre elas, é como uma aula de teologia. Como o mundo está em constante evolução, há que saber enquadrar a palavra de deus na realidade actual, logo nunca se repete. Depois o comer a hóstia significa compromisso para com deus."
(A tal parte complicada que quase ninguém cumpre).


Na realidade o rapaz explicou-me em 10 minutos o que nunca me explicaram na catequese, podia ter passado o tempo a ouvir o que o padre dizia durante a missa, podia ter aprendido alguma coisa. Não me explicou mais nada, disse que era mais de sentir do que explicar, convidou-me para um encontro mas recusei.
A religião católica tem muitas falhas, mas será que as outras são perfeitas? Não!
Pessoalmente estou convencida que nenhuma religião é dona da verdade absoluta e tão pouco tem os fiéis perfeitos!

E agora? Fico sem religião? Tenho fé, como a alimento?"

Aida...
Aida...
Aida...
Quanto à "Aida" (e vem agora a minha parte deste texto):
- Nunca mais vi a Aida... - pensei hoje, uma vez mais, ao ler o mail que me foi enviado.
Na verdade, raro é o dia em que não penso nela. Basta passar naquela pastelaria, ver um sumo, ver um corpo pequenino de saias, ao longe... Basta olhar para as moedas na carteira, ou pensar que a minha vida está de pantanas! Basta passar na calçada, e (tentar) ignorar o velho pedinte, sem pé...
Penso nela...

Porque será que um encontro de minutos marca assim?...
Será que a Aida existe?
Será fruto da minha fértil imaginação?

Ora, sucedeu, (e não ia escrever isto. Mas cá vai...), que talvez tenha (RE)ENCONTRADO a/uma Aida.

Entrei no posto dos correios, na 2ªfeira, para enviar um pacote ao meu mano de 17anos. Tirei a senha e vi que estavam umas dez pessoas à minha frente, todas jovens excepto uma velhinha (tipicamente vestida à Figueirense), empoleirada no balcão.
- Oh minha senhora, já lhe disse que não posso preencher isso com a minha letra. Não posso. Vai ter de resolver isso...
A velhinha explicava a situação e demorava a fazer-se entender.
Falava, gesticulava, apelava, invocava o nome do falecido e não saia do balcão.
Entre os presentes começou a suspirar-se pela demora mas ninguém se mexia para ajudar.
Foi então que a Lara se aproximou do balcão.
- Desculpe. Não sabe escrever, não é?
- Pois não, miga. Não sei... A minha vida foi o peixe e agora.. (suspirou) ele foi-se, faz um mês... e deixou-me com este fardo às costas.
Estendeu-me uma carta e limpou os olhos com um lencinho de pano.
- Posso ler? - perguntei enquanto estendia a mão para a folha. - Sabe o que é? - perguntei ao ver o logotipo de uma instituição de crédito.
- Sei pois, miga...
A fila aumentava e chamei a senhora para o banquinho. Depois de lhe ler a carta e perceber a explicação dela, que resumo numa burla de que o marido foi alvo, ajudei-a a preencher o vale dos correios para o pagamento da prestação mensal.
A fila, olhava, mais ou menos discreta e até havia alguns sorrisos de aprovação. No entanto, pergunto-me até quando ficaria a velhinha a chorar, pendurada no balcão se eu não estivesse lá?... Talvez alguém tivesse feito o mesmo... ou talvez não! Entre o preenchimento do documento, a explicação da carta e o que deveria fazer para mudar o titular (que afinal falecera), foi-me contando a vidinha dela.

(Deliciosa Aida, envelhecida! Pouco importa se o nome era Maria. Um dia já fui uma Aida, amanhã serei uma Maria, hoje sou uma Lara... ou talvez não...)

Quando ela assinou o vale com a letrinha redonda à escolinha primária, disse-lhe:
- Tem uma letra toda bonita. Afinal sabe escrever. Nem que seja só o seu nome...
Ela sorriu e agradeceu.
Voltou para o balcão e tratou do resto.
Eu passei para o meu lugar na fila e apeteceu-me chorar. Antes de sair, parou, curvada pela idade, e agradeceu outra vez.
- Deus a abençoe, que o paraiso é os justos. Vou-lhe rezar uma oração na missinha, miga.
- Bem preciso... com as asneiradas que tenho andado a fazer...
E sorri. E agradeci.
(Deliciosa Aida, envelhecida! Pouco importa...)