...REJOI AND BE GLAD...

Quero acreditar que os milagres acabam por chegar! Quando nem sempre os esperamos, mas quando mais precisamos deles! Chegam com a mesma intensidade com que os queremos receber... e com a dimensão exacta do que fizemos para os merecer!

6.10.08

... Aida, sinhora...

Sai da Conservatória e ela estava à porta.
- Moeda, sinhora… moeda…
- Não obrigada!
Na verdade nem olhei para ela. Levava o telemóvel ao ouvido e segui em frente, com o passo acelerado, para chegar ao carro antes de apanhar mais uma multa… (120 euros chegam! Este mês!)
Quando passei na vitrina notei que estava a ser seguida por um vulto bem mais pequeno que eu. E eu, em cada montra, olhava disfarçadamente para trás... vendo-a seguir-me como uma sombra.

Esperei que desistisse e continuei no meu caminho.

Quando finalmente me virei para trás, ela parou assustada e colocou os olhos no chão.
- Como é que te chamas? – perguntei enquanto me sentava no banquinho de cimento.
- Aida!
E estendeu-me a fotografia da família numerosa.
- Sinhora… - implorou. – Moeda…
- Senta-te aqui Aida! Quantos anos tens?
- 15.
- És cigana?
- Sim, sinhora.

A Aida pode ter 15 anos de idade, mas não na estatura.
Está vestida com umas calças grossas de lã cinzenta, com uns chinelos gastos, um vestido comprido por cima, com uma cor esbatida e morta, algures entre um vermelho sangue e um castanho Outonal. Aos ombros carrega um xaile escuro que lhe dá um ar ancião. Lembra-me uma Sul-Americana… Ou Mexicana, talvez, pelo arredondado do rosto!... Quase com uns traços Tibetanos, menina das Estepes, pela indumentária e pelo rasgado dos olhos... Uma Ibérica, também! Cigana, na cor da pele! Uma soviétiaca pelo sotaque da voz…
Não interessa!
É sem dúvida uma criança pela forma de sorrir!

- Então, Aida… Não devias estar na escola?
- Não. Aida não escola.
- Então vais casar! Já tens 15 anos...
- Não. Aida não casar!...
Voltou a colocar os olhos no chão e estendeu-me a mão trémula que apanhei antes de me cair no colo.
- Um pão, sinhora…

De mão dada lá fomos pela avenida principal da cidade até à pastelaria. Imagem estranha... mas de uma beleza indefinivel. Senti-me mãe. Senti-me útil. Senti-me guiada!
A Aida tem um óbvio problema de fala. Talvez tenha aquilo a que chamam de atraso! Não interessa. Entendo-a bem!
Perguntei-lhe se andava a vender alguma coisa e disse-me que não! (Ainda bem… Já tenho tantos pensos-rápidos em casa, que não consigo evitar de comprar-“lhes” pelo preço de um café!...)
Quem sabe se um dia não serei eu a ver-me obrigada a agarrar em todos eles e ir vende-los para a rua?!
Não se sabe… Ninguém sabe! (Ou talvez alguém saiba mas não diga!) Eu, falo por mim: - Não sei!

Deveria ter-lhe perguntado porque me seguiu. Porquê eu?
Mas… Achei que há coisas que não preciso saber!
Ou talvez já as saiba!
Prefiro acreditar que a Aida veio porque precisava dela… Porque eu precisava dar uma esmola em troca de um sorriso… porque precisava de receber uma esmola...
Precisava parar a olhar para um reflexo de mim mesma!
Talvez a Aida me tenha relembrado que não sou o reflexo que vejo na vitrina!
Quem sabe se ela não veio para arrancar do meu coração as saudades, as mágoas, as dores, as desilusões…
(Sim, porque eu também me iludo… também me minto… também magoo, também choro a saudade e também tenho coração!)

Prometi-me, algures no passado quando tentava entender uma passagem de um livro religioso, que nunca negaria uma esmola. Ou melhor, prometi ao meu Deus que sempre que um semelhante me abordasse, com fome ou com sede, no corpo ou no espirito, lhe daria o que precisasse, se tivesse para dar.
Assim foi!
Ao chegar à pastelaria a Aida olhou-me a sorrir!
Foi muito bem-educada e isso surpreendeu-me.
- Pão, sinhora?!
- Não, Aida! Escolhe o que quiseres comer…
Ela parou longamente a comer os bolos da vitrine e demorou a sentir qual lhe apetecia. Interrompi-a e perguntei se queria leite ou um sumo! Com um enorme sorriso, acenou com a cabeça e disse a palavra “sumo” três ou quatro vezes como se lhe estivesse a oferecer algo divino!
Entreguei-lhe a nota e disse para pagar.
Trouxe-me o troco e ficou de pé ao lado da mesa enquanto esperava o almoço.
- Senta-te Aida. Podes sentar-te.
Agradeceu-me tantas vezes que lhe perdi a conta. Mas isso não tinha importância nenhuma. Aquele sorriso não vou esquecer nunca. E quando a comida chegou, antes de lhe pegar, perguntou:
- Como chama sinhora?
- Lara.
- É bonita sinhora Lara.
- Sim? Obrigada! Tu também!
- Quer sinhora?
Não Aida, não vou comer, mas agradeço a partilha.
Hoje o meu almoço é para ti!
O meu orçamento já não dá para dois! Mas sei, que quando eu tiver fome, lá em cima, alguém me vai providenciar um bolo e um sumo!

Quando me levantei ela sorriu. E eu também…

8 comentários:

Anónimo disse...

Sinhora bonita...

No meio de tanto lixo e confusão sobressais da forma mais simples e marcante. Indescritivel e sem palavras a forma como tocas as "coisas", a forma como mexes com o Mundo. A forma como tudo em ti brilha e reflecte a beleza que tantas vezes nao queremos ou opamos por nao ver.

Estas longe (fisicamente) mas nunca foi isso que me fez amar-te. Vou continuar a amar-te ate me esquecer do que realmente importa. Porque tu estas em tudo o que importa. És o maior milagre do meu Mundo e de muitos mundos. Admiro-te demais...

Esse coração merece tudo...

Sinto que vou estar cada vez mais "longe" de ti mas sabe que seras sempre uma parte importante do meu dia, da minha vida, do meu Mundo...
Entraste no meu coração de uma brusca e repentina mas agora sinto-te calma e serena...

És amor!

Um beijo e um Xi

Haere Mai® disse...

Nada acontece por acaso minha amiga Lara! Nada! E não deve ser por acaso que te encontrei. Nesta minha busca infindável pelo Universo Do verdadeiro Ser Humano!És um ser lindíssimo, e encontras-te nas pequenas coisas.É nas pequenas coisas que encontramos O Mundo e o Universo de Nós. Bem-Hajas. Beijo Azul...Sempre!

Anónimo disse...

Às vezes gostava de ter coragem de fazer isso...
Não enxutar uma criança dessas e principalmente... Prometer algo a Deus e manter-me fiel...

Anónimo disse...

Mais uma vez me arrepio ao ler-te! E sei que o sorriso que provocaste na Aida deve ter sido um dos mais bonitos que o seu triste rosto já deu! Porque TU, tens esse dom! O dom de fazer sorrir de forma sincera. Também porque o teu sorriso é contagiante. Porque é arrebatador. Porque é TEU! E porque é ainda mais bonito quando o partilhas (eu sei, porque assim me sinto!)

Tens uma enorme capacidade de escrever coisas maravilhosas, que despertam em que lê, sorrisos, lágrimas... sentimentos de (uma) vida!
E é (também por isto que te amo!)

Big Kiss Princess Love y

Anónimo disse...

Olho à minha volta..

Existe uma janela grande que ilumina o quarto.. Procuro a origem de tanta luz e acordo então de um sonho que parecia infinito.. E volto à (ir)realidade da vida..!!

Pergunto-me se a janela existe afinal.. Olho à volta mas nada vejo.. Navego na minha mente, qual explorador de terras distantes.. Lá existe uma luz fraca que ilumina uma estrada curvilínea.. Percorro a estrada, mas tudo não passa de um círculo infinito e perfeito..

Penso..

Vivo..

Ainda estou aqui.. Em lado nenhum e em todo o lado.. Vivo para isto. Vivo para procurar a luz da janela.. Procuro sempre até a eternidade me fazer parar.. Enquanto procuro, vivo.. E vou esperando, esperando até encontrar a luz da janela..

Sei que a janela não existe.. Só a luz existe..

A luz és tu..

Um pouco de paz..
Um pouco de amor..
Um pouco de luz..

Deste-me tudo isso e foi.. É muito bom..!!
Foste.. ÉS aquela luz ao fundo do túnel que lentamente começo a ver..
Sair finalmente do casulo em que me tenho fechado e vivido para ver de novo a luz..!!

A escuridão não está tão sombria nem tão fria quanto antes estava..
O sol já espreita em finos raios de sol por entre as nuvens escuras que tem sido a minha vida ultimamente..

Talvez .. quem sabe seja um ponto de viragem na minha vida..!!

Não tenho ilusões.. sei que a qualquer momento as coisas podem de novo ficar na estaca zero..
Mas até lá quero tentar saborear este meu pequeno momento..!!

O momento em que começo a dar pequenos passos para a (minha) liberdade..
O momento em que começo de novo a respirar o ar puro da vida e me encho dele para não o perder totalmente outra vez..
Para que se tiver de levar (de novo) patada pelos meus próprios erros.. ao menos relembre o momento em que o pude fazer..

Um luz ao fundo do túnel.. um pouco do tanto que ÉS para mim..!!


(numa palavra).. MAKTUB!!


Bjnhs muitos e outros tantos


tua-maria

Ana disse...

Bom dia Sinhora Lara,
...estou a chorar, o mundo precisa de Laras, o que fizeste pela menina foi divinal, obrigado.
Beijos

Indecisa disse...

Antes demais, desculpe estar a entrar assim neste seu Mundo!

Já leio Blogue a algum tempo, mas só hoje decidi comentar. Após ler este post só tenho uma palavra a dizer! MARAVILHOSO!

Poderia dizer imensas coisas, mas acho que esta palavra é a ideal!

Tudo de bom. e continuarei a ler por cá :)
(esp que não haja problema)

Miss Mau Feitio disse...

Fantástico Lara!

Um bem haja..