Arundo donax

Simplesmente, parei na minha janela, já a madrugada ia longa!

Olho o canavial, obviamente inclinado para Sul, fruto da Nortada fustigante e inevitavelmente diária.
Olho as canas e sinto-me como elas…

(Mais um acesso de loucura, com certeza!)

Ainda que inclinadas, teimam em crescer rumo ao céu.
Bastam-lhes água (nos “pés”) e luz do sol (na “cabeça”)!
Também elas não devem saber de onde vem, nem porque cresceram aqui, atrás do muro, frente a uma janela que é, por enquanto, um pouco minha!

Não devem entender onde vão os que passam… e pergunto-me se terão inveja dos que podem ir e vir... (já que ser cana é não sair do lugar)...
Devem achar ridículas as discussões de beira de estrada, o corre-corre do dia a dia, devem rir-se de mim quando me observam do outro lado do vidro…
Imagino que invejam apenas o vento que vai e volta, sempre com o seu objectivo bem delineado (ainda que não óbvio).

Calculo que hoje arranjei um motivo para as canas existirem, AQUI!

Elas embelezam o meu mundo (e o de todos que tenham a loucura de parar a olhar para elas), escondem o betão do prédio ao lado, trazerem-me um verde de esperança jovial, purificam o ar que eu poluo.

Lembram-me que continuar a crescer é o único caminho! Alto, longe, firme rumo a um céu. É esse o caminho por mais forte que seja a Nortada.

Que “ir” e “crescer” não são a mesma coisa!

E que escolho a segunda, quando não for possível conciliar ambas!

Mesmo não indo além… quero que “o estar aqui” seja a única coisa que importa!
Com as raízes bem fundas, o lugar delas é ali… (e o meu lugar é aqui!)

E qualquer um que as olhe com um olhar puro, vai sentir algo parecido...